8 de outubro de 2009

Dos boquitos.

(...) Pancho lhe gritou que faltavam apenas quinze minutos para terminar o horário de trabalho, Juan Carlos encolheu os ombros, Pancho mandou-lhe uma banana e continuou trabalhando, mas poucos segundos depois correu até ele, como se estivesse a fazer uma travessura, e deu-lhe, para que se distraísse, o brinquedo mais cobiçado por seu amigo: um cigarro. Juan Carlos fumou na calçada, consciente de cada tragada. Uma menina quase adolescente passou e deu uma olhada nele. Às 16:55 os dois amigos chegaram ao único lugar em que Pancho se atrevia a entrar de macacão, o bar de uma pensão em frente da estação ferroviária. Juan Carlos lhe perguntou se ele, para continuar vivendo, se sujeitaria a ficar sem mulheres, a não beber mais e a deixar de fumar. Pancho lhe respondeu que não valia a pena voltar com tal assunto e bebeu um gole da bagaceira. Juan Carlos disse que ele falava a sério. Pancho não deu nenhuma resposta. Juan Carlos ia lhe dizer mais alguma coisa, porém se calou: que se tivesse que renunciar a viver como as pessoas sãs preferia morrer, mas que, mesmo que não lhe tirassem as mulheres e o cigarro, ainda assim preferia morrer se era em troca de trabalhar como um animal o dia inteiro, por uns tostões, para depois voltar para um barraco e lavar-se sob o jato de água fria da bomba. Juan Carlos lhe pediu outro cigarro. Pancho lhe deu sem protestar. Agradecido, Juan Carlos mandou vir mais bagaceira. Pancho lhe perguntou se tinha aproveitado a ocasião para olhar como era, de dia, o pátio da construção. Juan Carlos perguntou a Pancho se ele também tivera relações sexuais na noite anterior. Pancho falou que, como era fim do mês, não tinha dinheiro para ir ao La Criolla. Juan Carlos prometeu acompanhá-lo no dia 1º e lhe aconselhou que até lá abordasse a Rabadilha, a empregada do Doutor Aschero. Pancho lhe perguntou por que a chamavam de Rabadilha e Juan Carlos respondeu que quando menina tinha o traseiro proeminente, em forma de ponta, como a rabadilha de uma galinha; e que começaram a chamá-la assim no rancho onde fora criada por uma tia. Às 17:40 encerraram a conversa sobre Rabadilha, tendo Juan Carlos recomendado a Pancho que se ele não mandasse brasa e desse logo em cima da empregada, outro o faria antes dele. (...)

["Boquitas Pintadas", de Manuel Puig]

Um comentário:

  1. então, santa ignorância a minha... mas apesar de ter entendido a história, não vi de onde vem e pra onde vai a intenção do autor... =/
    "que burrico!" =P
    bjs

    ResponderExcluir